quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
Tempo de poesia...Adão e Eva de José Régio.
ADÃO e EVA, José Régio
Olhámo-nos um dia,
E cada um de nós sonhou que achara
O par que a alma e a cara lhe pedia.
- E cada um de nós sonhou que o achara...
E entre nós dois
Se deu, depois, o caso da maçã e da serpente,...
Se deu, e se dará continuamente:
Na palma da tua mão,
Me ofertaste, e eu mordi, o fruto do pecado.
- Meu nome é Adão...
E em que furor sagrado
Os nossos corpos nus e desejosos
Como serpentes brancas se enroscaram,
Tentando ser um só!
Ó beijos angustiados e raivosos
Que as nossas pobres bocas se atiraram
Sobre um leito de terra, cinza e pó!
Ó abraços que os braços apertaram,
Dedos que se misturaram!
Ó ânsia que sofreste, ó ânsia que sofri,
Sede que nada mata, ânsia sem fim!
- Tu de entrar em mim,
Eu de entrar em ti.
Assim toda te deste,
E assim todo me dei:
Sobre o teu longo corpo agonizante,
Meu inferno celeste,
Cem vezes morri, prostrado...
Cem vezes ressuscitei
Para uma dor mais vibrante
E um prazer mais torturado.
E enquanto as nossas bocas se esmagavam,
E as doces curvas do teu corpo se ajustavam
Às linhas fortes do meu,
Os nossos olhos muito perto, imensos,
No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
... Enquanto nós pairávamos, suspensos
Entre a terra e o céu.
Assim as almas se entregaram,
Como os corpos se tinham entregado,
Assim duas metades se amoldaram
Ante as barbas, que tremeram,
Do velho Pai desprezado!
E assim Eva e Adão se conheceram:
Tu conheceste a força dos meus pulsos,
A miséria do meu ser,
Os recantos da minha humanidade,
A grandeza do meu amor cruel,
Os veios de oiro que o meu barro trouxe...
Eu, os teus nervos convulsos,
O teu poder,
A tua fragilidade
Os sinais da tua pele,
O gosto do teu sangue doce...
Depois...
Depois o quê, amor?
Depois, mais nada,
- Que Jeová não sabe perdoar!
O Arcanjo entre nós dois abrira a longa espada...
Continuamos a ser dois,
E nunca nos pudemos penetrar!
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Poema maravilhoso, parabéns!
ResponderEliminarEu que agradeço por pensar em mim e afagar-me com seu carinho... minha alma sorri ante a tua, encontra lembranças nossas soltas no tempo e sente saudade de ti.. bjo!
ResponderEliminarPoema forte e sensual. Imagem a condizer. Parabéns ao blog pela diversidade. Não é um vídeo musical mas a poesia substitui primorosamente a música. Sente-se a intensidade das palavras. Pena~o blog não ter música de fundo...
ResponderEliminarUm espaço que merece ser visitado...
ResponderEliminarUm blog com bons clips musicais, poesia e critica política com alguma independência. Uma pedrada no charco...
ResponderEliminarQue poema! Já o li vezes sem conta e voz alta!
ResponderEliminarExcelente escolha ...
ResponderEliminarCom um final "penetrante" ...!
BOM FDS!
Um Abraço da M&M & Cª!
Olha...outra adaptação da "Eva e Adão"... esta é minha:)
ResponderEliminar"Ah pois foi... a branca de neve... no meio dos despojos, veio envenenada.
Comi-a. Teve que ser. Ou era ela, ou era o Adão e alguém estava a mais no paraíso!
A serpente traíu-me!
Prometeu-me juras de amor e afinal... sim, depois de me envenenar, foi-se também ela para o deserto.
Fiquei sozinha no paraíso... e lá está... sim, pois foi... a maça comi-a, mas e o caroço? Ficou... no chão... estará também ele envenenado? Será que vale a pena plantar aqui mais uma árvore da sabedoria... não.
Não quero mais saber.
Vou plantar uma 'Árvore da Memória', com um caroço esquecido, daquela maça que Deus me fez comer. Não mais me fiarei no 'eterno', no felizes para sempre...
A Branca de Neve afinal morreu mesmo; e o seu príncipe encantado nem quis saber... foi-se a galope.
Diz ele, a seu favor, que foi para fugir de uma serpente...
e eu? Que é feito de mim, sozinha no paraíso!?
E o que foi feito de ti minha amada?
A maça que me deste, afinal...
...vinha envenenada."
(Lx, 27 Maio 05)