quinta-feira, 28 de abril de 2011

Adeus Segunda-Feira Cinzenta - Zé Ramalho.

Adeus Segunda-feira Cinzenta

Composição: Zé Ramalho

Cachorro latindo, chorando sem pai

O tempo mentindo que o vento do norte não sabe soprar

O mar se levanta com tal desespero

Que eu penso que a terra não sente a cratera

Querendo lavar

Levar a cabeça pro fundo do mar

E ver que essa areia de grãos tão pequenos

É chão de um país

Que foi que eu fiz pra não merecer

Um beijo mais quente que a boca do povo viria dizer

Dizer que me amas, que és meu amor

Mas onde procuro, a côr desse olho é denso negror

É como o bafejo da hidra de sal

Dragões do meu sono, que rasgam anúncios na televisão

Eu tenho um espelho cristalino

Que uma baiana me mandou de maceió

Ele tem uma luz que alumia

Ao meio - dia reflete a luz do sol


terça-feira, 26 de abril de 2011

Destruição dos pórticos da Via do Infante.


Os Novos Heróis do 25 de Abril

Sabemos que um grande número de algarvios estão contra o pagamento das portagens na Via do Infante;

Sabemos das manifestações e marchas lentas que muitos condutores têm efectuado com a finalidade de protestar contra a cobrança das portagens. Sempre de forma ordeira e pacífica. Próprio de um país democrático;

Sabemos do recuo do actual governo deixando, e bem, para o próximo, a decisão da cobrança, ou não, das portagens na Via Infante.

Por isso não entendo que uns energúmenos ou uma turba de vândalos tenham destruído, de forma concertada, bens do estado. Pagos com o dinheiro, como eles tanto gostam de apregoar, de todos nós. Mostraram, sem dúvida, quanto corajosos são. Tanto que, espero, e creio que vai acontecer, a Polícia Judiciária, os consiga identificar e que eles sejam punidos exemplarmente.

Vivemos em democracia. Há maneiras diferentes de exercer pressão política para serem ouvidos sem necessidade de recorrerem à violência. No caso concreto bem podiam, por exemplo, exigir aos candidatos a deputados pelo círculo do Algarve, um compromisso de honra que os obrigasse a votar, na Assembleia da República, contra o pagamento das portagens da Via do Infante. Um compromisso  em que os deputados pelo círculo do Algarve não se comportassem como bovinos ou carneiros e actuassem de harmonia com a sua consciência e declarações públicas e não seguindo as directrizes do partido a que pertencem. Mas a turba de vândalos preferiu a destruição. Comportaram-se tal como as claques de futebol. O 25 de Abril não merecia isto!!!

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Revolução dos Cravos - 25 de Abril de 1974


Homenagem a Salgueiro Maia - Capitão de Abril - Vídeo com a canção "E Depois do Adeus" de Paulo Carvalho, 1ª senha para despoletar a revolução - e "Grândola Vila Morena", de José Afonso, a 2ª senha...



"As Portas que Abril Abriu". Declamação e poema de José Ary dos Santos.



"Tanto Mar" homenagem de Chico Buarque à Revolução dos Cravos.

Sondagem: PS ultrapassa PSD nas intenções de voto a seis semanas das eleições .

Eu não confio nestes figurantes. Você confia? O amadorismo e a incompetência podem causar uma verdadeira surpresa no dia 5 de Junho...


Também não confio nestes. Mas são profissionais em marketing político e pessoal e têm uma máquina partidária bem afinada. Ah!!! E o "relativo" engenheiro, o mágico do canudo a um domingo, o ilusionista da destruição de emprego e das contas do país, esse, é imbatível!!! Felizmente afirmou não estar disponível para governar com o FMI. Óbvio que vai se demitir se ganhar as eleições. Isso aconteceria se ele não fosse também conhecido como o "Pinóquio"...




José Mário Branco e Sérgio Godinho:
O charlatão
(S. Godinho/J. M. Branco)
Numa rua de má fama
faz negócio um charlatão
vende perfumes de lama
anéis de ouro a um tostão
enriquece o charlatão
No beco mal afamado
as mulheres não têm marido
um está preso, outro é soldado
um está morto e outro ferido
e outro em França anda perdido
É entrar, senhorias
a ver o que cá se lavra
sete ratos, três enguias
uma cabra abracadabra
Na ruela de má fama
o charlatão vive à larga
chegam-lhe toda a semana
em camionetas de carga
rezas doces, paga amarga
No beco dos mal fadados
os catraios passam fome
têm os dentes enterrados
no pão que ninguém mais come
os catraios passam fome
Na travessa dos defuntos
“charlatões” e charlatonas
discutem dos seus assuntos
repartem-se em quatro zonas
instalados em poltronas
Prá rua saem toupeiras
entra o frio nos buracos
dorme a gente nas soleiras
das casas feitas em cacos
em troca de alguns patacos
Entre a rua e o país
vai o passo dum anão
vai o rei que ninguém quis
vai o tiro dum canhão
e o trono é do charlatão.



quarta-feira, 20 de abril de 2011

José Sócrates colocado à venda num site de leilões.



"Vende-se primeiro-ministro de Portugal". Motivo: "Liquidação do país". É assim que é apresentado um anúncio num site de leilões português, que coloca José Sócrates à venda.

Costuma dizer-se que tudo à está à venda na Internet. Desde casas a roupa interior de celebridades ou torradas com a cara de Jesus Cristo, tudo serve para ganhar uns trocos. E, agora... até José Sócrates está à venda.
A brincadeira surgiu hoje no site português Leiloes.net e começou a disseminar-se, claro, pelas redes sociais.
"Vende-se primeiro-ministro de Portugal." Motivo: "Liquidação do país (alternativa a empréstimo do FMI)", explica o anúncio. Mas não se pense que a compra é barata. Afinal, estamos em crise, pelo que José Sócrates custa a módica quantia de... €75 mil milhões. Ou seja, quase tanto quanto o resgate solicitado ao FMI/União Europeia/Banco Central Europeu.

 

Artigo "usado" mas "licenciado com distinção num domingo" 

Mas, se isso lhe parece muito, o anunciante - identificado apenas como "anocas2011" - faz questão de enumerar as qualidades de José Sócrates: "Boa aparência, com guarda-fatos e teleponto incluído. Excelente marketeer, até garantir a venda de gelo no Pólo Norte ou areia na praia. Desenrascado, persistente e com boa imagem do lado esquerdo e lado direito."

O anunciante diz que o "artigo à venda" já está "usado", mas oferece os portes de envio e continua a listar "qualidades": "Licenciado com distinção num domingo e boa capacidade para idiomas como o castelhano e inglês."
Caso esteja interessado nesta "pechincha", o anunciante informa que tem até ao dia 3 de maio para licitar. E assim Portugal já poderá não precisar de recorrer a ajuda externa... 


NOTA: O anúncio já foi retirado pela casa de leilões on-line. O FMI exerceu o direito de opção.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Apontamentos...

O Dr. Fernando Nobre, ex-candidato a Presidente da República e o homem forte em Portugal da Assistência Médica Internacional (AMI), cansou-se de ver crianças correndo atrás de galinhas para lhes roubar o pão que levavam no bico. Cansou-se tanto que, perante a oferta de quem lhe ofereceu o "tacho" mais elevado, não hesitou um segundo em aceitar, contrariando todas as afirmações que até então fizera. Mais um político oportunista que vai engrossar as fileiras do nosso parlamento. Com a agravante de ter fortes possibilidades de ser escolhido para Presidente do Parlamento.

O Presidente da Região Autónoma da Madeira, Dr. Alberto João Jardim, afirmou, durante o congresso do PSD daquela região que Pedro Passos Coelho era um estadista. Se ele, Alberto, o diz, eu acredito. Só faltou dizer em que país. Mas tudo indica que será na República Centro-Africana. País de Bokassa!
Pedro Passos Coelho, além de estadista e de um homem invulgar, é sem dúvida um homem coerente. Coerente porque sempre tem afirmado que só escolherá os melhores. E, no seguimento disso, escolheu Fernando Nobre para cabeça de lista em Lisboa. Não a pensar nos mais de 500 mil votos que o homem teve nas eleições presidenciais mas tão só na sua competência. Que, como todos sabemos, muito cimentada e com provas dadas. Principalmente pelos zigue zagues políticos.  Monárquico em 1992, na comissão política de Mário Soares em 2006, na comissão de honra da candidatura de António Capucho a Cascais em 2009 e, nesse mesmo ano mandatário nacional do Bloco de Esquerda nas eleições europeias. Homens experientes como Fernando Nobre é que o país precisa.

Finalmente o governo decidiu desistir do projecto megalómano que representava o TGV. Já não era sem tempo. Resta saber é quanto as Motas Egis vão receber de indemnização...
O espectáculo de ilusionismo e de magia continua a ser a marca de José Sócrates. Só não entendi o motivo porque só lá estava gente crescida quando os convidados deviam de ter sido maioritariamente crianças. Alguém me pode explicar?

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Preço da gasolina bate recorde...


Porque tristezas não pagam dívidas...


O que Brigitte Bardot tem a haver com o preço da gasolina? Nada, acho eu. Simplesmente me apeteceu!!!

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Poesia - Daniel Filipe, poeta caboverdiano (1925-1964)

Daniel Filipe

A invenção do amor

Em todas as esquinas da cidade
nas paredes dos bares à porta dos edifícios públicos nas janelas dos autocarros
mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de aparelhos de rádio e
detergentes na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém
no átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da nossa
esperança de fuga
um cartaz denuncia o nosso amor


Em letras enormes do tamanho do medo da solidão da angústia
um cartaz denuncia que um homem e uma mulher
se encontraram num bar de hotel
numa tarde de chuva
entre zunidos de conversa
e inventaram o amor com carácter de urgência
deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia quotidiana

Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração
e fome de ternura e souberam entender-se sem palavras inúteis
Apenas o silêncio A descoberta A estranheza
de um sorriso natural e inesperado

Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna
Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente
Embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta
de um amor subitamente imperativo

Um homem uma mulher um cartaz de denúncia
colado em todas as esquinas da cidade
A rádio já falou A TV anuncia
iminente a captura A policia de costumes avisada
procura os dois amantes nos becos e avenidas
Onde houver uma flor rubra e essencial
é possível que se escondam tremendo a cada batida na porta
fechada para o mundo
É preciso encontrá-los antes que seja tarde
Antes que o exemplo frutifique
Antes que a invenção do amor se processe em cadeia

Há pesadas sanções paras os que auxiliarem os fugitivos

Chamem as tropas aquarteladas na província
convoquem os reservistas os bombeiros os elementos da defesa passiva
Todos
Decrete-se a lei marcial com todas as suas consequências
O perigo justifica-o
Um homem e uma mulher
conheceram-se amaram-se perderam-se no labirinto da cidade
É indispensável encontrá-los dominá-los convencê-los antes que seja demasiado tarde
e a memória da infância nos jardins escondidos
acorde a tolerância no coração das pessoas


Fechem as escolas
Sobretudo protejam as crianças da contaminação
Uma agência comunica que algures ao sul do rio
um menino pediu uma rosa vermelha
e chorou nervosamente porque lha recusaram
Segundo o director da sua escola é um pequeno triste
Inexplicavelmente dado aos longos silêncios e aos choros sem razão
Aplicado no entanto Respeitador da disciplina
Um caso típico de inadaptação congénita disseram os psicólogos
Ainda bem que se revelou a tempo
Vai ser internado
e submetido a um tratamento especial de recuperação
Mas é possível que haja outros. É absoIutamente vital que o diagnóstico se faça no período primário da doença
E também que se evite o contágio com o homem e a mulher
de que se fala no cartaz colado em todas as esquinas da cidade

Está em jogo o destino da civilização que construímos
o destino das máquinas das bombas de hidrogénio
das normas de discriminação racial
o futuro da estrutura industrial de que nos orgulhamos
a verdade incontroversa das declarações políticas

Procurem os guardas dos antigos universos concentracionários
precisamos da sua experiência onde quer que se escondam
ao temor do castigo

Que todos estejam a postos
Vigilância é a palavra de ordem
Atenção ao homem e à mulher de que se fala nos cartazes
À mais ligeira dúvida não hesitem denunciem
Telefonem à polícia ao comissariado ao Governo Civil
não precisam de dar o nome e a morada
e garante-se que nenhuma perseguição será movida
nos casos em que a denúncia venha a verificar-se falsa

Organizem em cada bairro em cada rua em cada prédio
comissões de vigilância. Está em jogo a cidade o país a civilização do ocidente
esse homem e essa mulher têm de ser presos
mesmo que para isso tenhamos de recorrer às medidas mais drásticas

Por decisão governamental estão suspensas as liberdades individuais
a inviolabilidade do domicílio o habeas corpus o sigilo da correspondência
Em qualquer parte da cidade um homem e uma mulher amam-se ilegalmente
espreitam a rua pelo intervalo das persianas
beijam-se soluçam baixo e enfrentam a hostilidade nocturna
É preciso encontrá-los
É indispensável descobri-los
Escutem cuidadosamente a todas as portas antes de bater
É possível que cantem
Mas defendam-se de entender a sua voz
Alguém que os escutou
deixou cair as armas e mergulhou nas mãos o rosto banhado de lágrimas
E quando foi interrogado em Tribunal de Guerra
respondeu que a voz e as palavras o faziam feliz
Lhe lembravam a infância
Campos verdes floridos Água simples correndo A brisa nas montanhas

Foi condenado à morte é evidente
É preciso evitar um mal maior
Mas caminhou cantando para o muro da execução
foi necessário amordaçá-lo e mesmo assim desprendia-se dele
um misterioso halo de uma felicidade incorrupta

Impõe-se sistematizar as buscas Não vale a pena procurá-los
nos campos de futebol no silêncio das igrejas nas boîtes com orquestra privativa
Não estarão nunca aí
Procurem-nos nas ruas suburbanas onde nada acontece
A identificação é fácil
Onde estiverem estará também pousado sobre a porta
um pássaro desconhecido e admirável ou florirá na soleira a mancha vegetal de uma flor luminosa
Será então aí
Engatilhem as armas invadam a casa disparem à queima roupa
Um tiro no coração de cada um
Vê-los-ão possivelmente dissolver-se no ar Mas estará completo o esconjuro
e podereis voltar alegremente para junto dos filhos e da mulher

Mas ai de vós se sentirdes de súbito o desejo de deixar correr o pranto
Quer dizer que fostes contagiados Que estais também perdidos para nós
É preciso nesse caso ter coragem para desfechar na fronte o tiro indispensável
Não há outra saída A cidade o exige
Se um homem de repente interromper as pesquisas
e perguntar quem é e o que faz ali de armas na mão
já sabeis o que tendes a fazer Matai-o Amigo irmão que seja
matai-o Mesmo que tenha comido à vossa mesa e crescido a vosso lado
matai-o Talvez que ao enquadrá-lo na mira da espingarda
os seus olhos vos fitem com sobre-humana náusea
e deslizem depois numa tristeza líquida
até ao fim da noite Evitai o apelo a prece derradeira
um só golpe mortal misericordioso basta
para impor o silêncio secreto e inviolável

Procurem a mulher e o homem que num bar
de hotel se encontraram numa tarde de chuva
Se tanto for preciso estabeleçam barricadas
senhas salvo-condutos horas de recolher
censura prévia à Imprensa tribunais de excepção
Para bem da cidade do país da cultura
é preciso encontrar o casal fugitivo
que inventou o amor com carácter de urgência

Os jornais da manhã publicam a notícia
de que os viram passar de mãos dadas sorrindo
numa rua serena debruada de acácias
Um velho sem família a testemunha diz
ter sentido de súbito uma estranha paz interior
uma voz desprendendo um cheiro a primavera
o doce bafo quente da adolescência longínqua
No inquérito oficial atónito afirmou
que o homem e a mulher tinham estrelas na fronte
e caminhavam envoltos numa cortina de música
com gestos naturais alheios Crê-se que a situação vai atingir o climax
e a polícia poderá cumprir o seu dever

Um homem uma mulher um cartaz de denúncia
A voz do locutor definitiva nítida
Manchetes cor de sangue no rosto dos jornais

É PRECISO ENCONTRÁ-LOS ANTES QUE SEJA TARDE

Já não basta o silêncio a espera conivente o medo inexplicado
a vida igual a sempre conversas de negócios
esperanças de emprego contrabando de drogas aluguer de automóveis
Já não basta ficar frente ao copo vazio no café povoado
ou marinheiro em terra a afogar a distância
no corpo sem mistério da prostituta anónima
Algures no labirinto da cidade um homem e uma mulher
amam-se espreitam a rua pelo intervalo das persianas
constroem com urgência um universo do amor
E é preciso encontrá-los E é preciso encontrá-los

Importa perguntar em que rua se escondem
em que lugar oculto permanecem resistem
sonham meses futuros continentes à espera
Em que sombra se apagam em que suave e cúmplice
abrigo fraternal deixam correr o tempo
de sentidos cerrados ao estrépito das armas
Que mãos desconhecidas apertam as suas
no silêncio pressago da cidade inimiga

Onde quer que desfraldem o cântico sereno rasgam densos limites entre o dia e a noite E é preciso ir mais longe destruir para sempre o pecado da infância erguer muros de prisão em circulos fechados impor a violência a tirania o ódio

Entretanto das esquinas escorre em letras enormes
a denúncia total do homem e da mulher
que no bar em penumbra numa tarde de chuva
inventaram o amor com carácter de urgência

COMUNICADO GOVERNAMENTAL À IMPRENSA

Por diversas razões sabe-se que não deixaram a cidade o nosso sistema policial é óptimo estão vigiadas todas as saídas encerramos o aeroporto patrulhamos os cais há inspectores disfarçados em todas as gares de caminhos de ferro

É na cidade que é preciso procurá-los
incansavelmente sem desfalecimentos
Uma tarefa para um milhão de habitantes
todos são necessários
todos são necessários
Não sem preocupem com os gastos a Assembleia votou um crédito especial
e o ministro das Finanças
tem já prontas as bases de um novo imposto de Salvação Pública


Depois das seis da tarde é proibido circular
Avisa-se a população de que as forças da ordem
atirarão sem prevenir sobre quem quer que seja
depois daquela hora Esta madrugada por exemplo
uma patrulha da Guarda matou no Cais da Areia
um marinheiro grego que regressava ao seu navio

Quando chegaram junto dele acenou aos soldados
disse qualquer coisa em voz baixa e fechou os olhos e morreu
Tinha trinta anos e uma família à espera numa aldeia do Peloponeso
O cônsul tomou conhecimento da ocorrência e aceitou as desculpas
do Governo pelo engano cometido
Afinal tratava-se apenas de um marinheiro qualquer
Todos compreenderam que não era caso para um protesto diplomático
e depois o homem e a mulher que a policia procura
representam um perigo para nós e para a Grécia
para todos os países do hemisfério ocidental
Valem bem o sacrifício de um marinheiro anónimo
que regressava ao seu navio depois da hora estabelecida
sujo insignificante e porventura bêbado


SEGUE-SE UM PROGRAMA DE MÚSICA DE DANÇA

Divirtam-se atordoem-se mas não esqueçam o homem e a mulher
Escondidos em qualquer parte da cidade
Repete-se é indispensável encontrá-los
Um grupo de cidadãos de relevo ofereceu uma importante recompensa
destinada a quem prestar informações que levem à captura do casal fugitivo
Apela-se para o civismo de todos os habitantes
A questão está posta É preciso resoIvê-la para que a vida reentre na normalidade habitual
Investigamos nos arquivos Nada consta
Era um homem como qualquer outro
com um emprego de trinta e oito horas semanais
cinema aos sábados à noite
domingos sem programa
e gosto pelos livros de ficção cientifica
Os vizinhos nunca notaram nada de especial
vinha cedo para casa
não tinha televisão,deitava-se sobre a cama logo após o jantar
e adormecia sem esforço

Não voltou ao emprego o quarto está fechado
deixou em meio as «Crónicas marcianas»perdeu-se precipitadamente no labirinto da cidade
à saída do hotel numa tarde de chuva
O pouco que se sabe da mulher autoriza-nos a crer
que se trata de uma rapariga até aqui vulgar
Nenhum sinal característico nenhum hábito digno de nota
Gostava de gatos dizem Mas mesmo isso não é certo
Trabalhava numa fábrica de têxteis como secretária da gerência
era bem paga e tinha semana inglesa
passava as férias na Costa da Caparica.

Ninguém lhe conhecia uma aventura
Em quatro anos de emprego só faltou uma vez
quando o pai sofreu um colapso cardíaco
Não pedia empréstimos na Caixa
Usava saia e blusa
e um impermeável vermelho no dia em que desapareceu

Esperam por ela em casa: duas cartas de amigas o último número de uma revista de modas a boneca espanhola que lhe deram aos sete anos Ficou provado que não se conheciam Encontraram-se ocasionalmente num bar de hotel numa tarde de chuva sorriram inventaram o amor com carácter de urgência mergulharam cantando no coração da cidade

Importa descobri-los onde quer que se escondam antes que seja demasiado tarde e o amor como um rio inunde as alamedas praças becos calçadas quebrando nas esquinas

Já não podem escapar Foi tudo calculado
com rigores matemáticos Estabeleceu-se o cerco
A policia e o exército estão a postos Prevê-se
para breve a captura do casal fugitivo
(Mas um grito de esperança inconsequente vem
do fundo da noite envolver a cidade
au bout du chagrin une fenêtre ouverte
une fenêtre eclairée).




sábado, 2 de abril de 2011

A melhor frase do ano...

«O debate quinzenal com o Primeiro-Ministro que estava marcado para o dia das mentiras foi cancelado. Já não há respeito pela tradição».

(dito por: António Filipe, deputado do partido comunista).

encontrei no blog: http://samuel-cantigueiro.blogspot.com/

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Músicas que me marcaram...(4)

No 1º vídeo Elis Regina e Tom Jobim; No 2º vídeo Elis Regina a solo...

Águas De Março

Elis Regina
 Composição : Tom Jobim 


É pau é pedra
  É o fim do caminho
  É um resto de toco
  É um pouco sozinho...

É um caco de vidro
  É a vida é o sol
  É a noite é a morte
  É um laço é o anzol...

É peroba do campo
  É o nó da madeira
  Caingá, Candeia
  É o matita-pereira...

É madeira de vento
  Tombo da ribanceira
  É um mistério profundo
  É o queira ou não queira...

É o vento ventando
  É o fim da ladeira
  É a viga é o vão
  Festa da Cumeeira...

É a chuva chovendo
  É conversa ribeira
  Das águas de março
  É o fim da canseira...

É o pé é o chão
  É a marcha estradeira
  Passarinho na mão
  Pedra de atiradeira...

É uma ave no céu
  É uma ave no chão
  É um regato é uma fonte
  É um pedaço de pão...

É o fundo do poço
  É o fim do caminho
  No rosto um desgosto
  É um pouco sozinho...

É um estrepe é um prego
  É uma ponta é um ponto
  É um pingo pingando
  É uma conta é um conto...

É um peixe é um gesto
  É uma prata brilhando
  É a luz da manhã
  É o tijolo chegando...

É a lenha é o dia
  É o fim da picada
  É a garrafa de cana
  Estilhaço na estrada...

É o projeto da casa
  É o corpo na cama
  É o carro enguiçado
  É a lama é a lama...

É um passo é uma ponte
  É um sapo é uma rã
  É um resto de mato
  Na luz da manhã...

São as águas de março
  Fechando o verão
  E a promessa de vida
  No teu coração...

É uma cobra é um pau
  É João é José
  É um espinho na mão
  É um corte no pé...

São as águas de março
  Fechando o verão
  É a promessa de vida
  No teu coração...

É pau é pedra
  É o fim do caminho
  É um resto de toco
  É um pouco sozinho...

É um passo é uma ponte
  É um sapo é uma rã
  É um belo horizonte
  É uma febre terçã...

São as águas de março
  Fechando o verão
  É a promessa de vida
  No teu coração...

-Pau, -Edra, -Im, -Inho
-Esto, -Oco, -Ouco, -Inho
-Aco, -Idro, -Ida, -Ol
-Oite, -Orte, -Aço, -Zol...

São as águas de março
  Fechando o verão
  É a promessa de vida
  No teu coração...