terça-feira, 11 de outubro de 2011

Poema de Miguel Torga

AMEAÇA DE MORTE


Não basta ter-me dado nos meus versos:
pedem a carne e a pele, os inimigos.
Os olhos, dois postigos
de olhar o mundo sem ninguém me ver,
querem-nos entaipados;
e quebrados
os braços, que eram ramos a crescer.

Luto, digo que não, peço socorro,
mas saíu-me ao caminho uma alcateia.
Lobos da liberdade alheia
que me seguem os passos hora a hora,
sem que eu possa sequer adivinhar,
na paisagem do medo tumular,
qual deles salta primeiro e me devora.


Poema II - José Vultos Sequeira

AS VOZES


o
senhor administrador dentro do carro
olha de sobrolho franzido
a manifestação em frente à sede da empresa

a polícia está lá
para evitar que a gentalha se aproxime
e o porteiro
perfilado abre-lhe a porta

o senhor administrador
esfrega as mãos
sorri à secretária
e pergunta
se as cartas para os seus pares
foram enviadas e se as reserva das suites
estão garantidas

«custa um milhão» - esclarece ela solícita -
não há problema - diz ele - são personalidades políticos
jornalistas empresários nossos amigos
mas aquela gente à porta ó minha querida
já disse alguma coisa ao ministro
ligue-lhe e passe-me o telefone»

pouco depois correrias gritos tiros

e alguns dias mais tarde o
ministro - mas meu caro não sei o que lhe hei-de dizer
eles não desistem

e na manhá levantada reerguem-se as vozes uma
canção um protesto a vida


Nota: ambos os poemas foram "surripiados" do blog CRAVOS DE ABRIL.
http://cravodeabril.blogspot.com/


2 comentários:

  1. Surripiou-os bem!

    Um protesto bem dito por sinal.

    É bom passar aqui e ver algo diferente, mas real.
    Bjos.

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  2. Um protesto em poesia. É diferente, eu gostei.

    Beijos

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